A arquitetura, ao longo da história, sempre esteve associada à elite e aos mais ricos, que encomendavam edifícios suntuosos para satisfazer suas necessidades estéticas e funcionais. Essa tendência remonta a civilizações antigas: faraós egípcios construíam pirâmides e templos imponentes, imperadores romanos erguiam anfiteatros e palácios magníficos. A arquitetura era, e muitas vezes ainda é, um símbolo de poder e prestígio. Com o tempo a profissão se expandiu para abranger diversos tipos de edifícios e públicos, desde residências simples até estruturas públicas e comerciais e o avanço da tecnologia e das técnicas de construção tornou-a mais acessível em termos de custos. Mas a desigualdade em relação ao acesso a bons projetos de arquitetura ainda prevalece, especialmente em países subdesenvolvidos ou contextos vulneráveis socialmente. Diversas regiões enfrentam sérios problemas de habitação, infraestrutura e planejamento urbano devido à falta de recursos e investimentos adequados, com condições construtivas precárias, com áreas de favelas, falta de saneamento básico e edifícios inseguros.
Ainda que este seja um problema estrutural e de complexa resolução integral, há indivíduos que não conseguem permanecer de braços cruzados e buscam enfrentar o problema sem depender do sistema tradicional. Uma delas é a Journeyman International (JI), uma organização sem fins lucrativos, que vem redefinindo a maneira como abordamos o projeto arquitetônico em contextos humanitários. O coração da instituição está no compromisso de conectar estudantes universitários a desafios humanitários do mundo real e, através da colaboração, o envolvimento da comunidade e de estudantes, tem recebido atenção e admiração internacionais. Carly Althoff, arquiteta e diretora executiva da Journeyman International, Inc., conversou conosco e destaca essa abordagem: "Nenhum outro programa no mundo se relaciona com o meio acadêmico desta forma, formando a próxima geração de arquitetos sociais através da investigação e de projetos ao vivo." Ao vincular arquitetos e projetistas aspirantes a experiências práticas e no solo, JI está alimentando uma geração de profissionais com uma compreensão mais profunda dos desafios complexos que as comunidades enfrentam.
A primeira experiência ocorreu em 2009, quando estudantes de arquitetura e construção se uniram para colaborar em um projeto de uma clínica em Belize. Desde esse projeto original, milhares de estudantes e profissionais já se envolveram de alguma forma, seja pesquisando a construção de bambu em áreas propensas a desastres ou projetando dormitórios de orfanato resistentes a inundações na África Central. Trabalhando em grupos, individualmente ou como parte de uma classe, com os gerentes de projeto alinhando o trabalho com horários acadêmicos, busca-se equilibrar as necessidades do cliente com as entregas dos alunos, e o currículo de design agora já é adotado por universidades em 5 continentes.
Um diferencial de JI é a sua abordagem para ampliar o seu impacto pelo mundo. Em vez de trabalhar de forma isolada e centralizada, a organização estabelece escritórios regionais nas regiões onde atua. Gerentes de projetos locais são contratados para coordenar o trabalho voluntário de design e fornecer serviços arquitetônicos acessíveis. De acordo com Althoff, essa abordagem ajuda a "diversificar as fontes de rendimento e diminuir as lacunas culturais entre os voluntários internacionais e os parceiros locais". Esse foco na inclusão e colaboração cria uma abordagem mais holística e culturalmente sensível para seus projetos.
Design contextual: aproveitando ao máximo os recursos locais
A ideia é que cada trabalho esteja profundamente enraizado no contexto. Todo projeto começa com pesquisas abrangentes sobre recursos locais, técnicas de construção e tecnologias disponíveis. Essa abordagem garante que os projetos arquitetônicos não sejam apenas inovadores, mas também contextualmente apropriados. Para isso, a instituição promove um relacionamento significativo com representantes da comunidade local e especialistas em construção, garantindo que a visão da comunidade esteja no centro de todos os projetos.
Estabelecemos contato com representantes da comunidade local que orientam o nosso processo de investigação e conceção, desenvolvendo em conjunto parâmetros de concepção baseados nos métodos de construção viáveis. Sem alargar os limites da inovação para além do conhecimento da tradição local e das condições ambientais, trabalhamos em conjunto com a comunidade local desde o primeiro dia.
Superando desafios
Um dos principais obstáculos é a materialização das soluções projetuais para a implementação, especialmente em áreas remotas. Isso demanda uma rede de apoio, vital para que os projetos possam prosperar, além da definição dos materiais e sistemas construtivos disponíveis ali. "Por vezes, é possível utilizar uma gama muito limitada de materiais de construção, pelo que trabalhamos dentro dos limites impostos para encontrar soluções criativas para espaços mais resilientes e inspiradores. Isto permite-nos co-desenvolver parâmetros de design com a comunidade com base nos métodos de construção que conseguimos implementar de forma viável."
Profissionais da indústria de design e do campo de arquitetura têm um papel significativo a desempenhar na missão de JI, que recebe voluntários e mentores de todo o mundo, explicando que eles podem "trabalhar remotamente em um conceito de design em colaboração com parceiros locais da comunidade". Muitos profissionais optam por permanecer envolvidos, fornecendo orientação e apoio em andamento a designers e estudantes mais jovens.
Quando as organizações humanitárias e de desenvolvimento estão a trabalhar com as comunidades para construir instalações que sirvam as suas necessidades, por vezes não têm acesso a apoio de alta qualidade na conceção de projectos de arquitetura. Ou há poucos profissionais locais capazes de ajudar, ou o preço de serviços de arquitetura completos está fora do alcance. É aí que a Journeyman entra em ação e preenche as lacunas que a capacidade local possa ter. Ao longo dos últimos 15 anos, provamos a nossa capacidade de apoiar esforços humanitários de pequena e média escala, mas a nossa rede expandiu-se tanto em tamanho como em nível de competências. Temos agora a capacidade de aumentar o nosso impacto à medida que aumentamos a nossa rede de arquitectos sociais e criamos centros de coordenação regional. Para continuar a capacitar esta rede em crescimento, estamos a depender principalmente de doações de caridade dos patrocinadores da JI. Com um maior apoio, pretendemos contratar mais coordenadores de projetos na África, no Sudeste Asiático e em outros locais.
Ao longo dos anos, Journeyman International esteve envolvido em vários projetos impactantes, mudando a vida de indivíduos e comunidades. Carly afirma que: "O nosso objetivo é tornar a conceção segura, sustentável e contextualmente adequada acessível às comunidades em crise. Preenchemos lacunas na capacidade local e oferecemos apoio de alta qualidade à concepção arquitetônica". Em um mundo em que o ambiente construído desempenha um papel crítico na vida das pessoas, Journeyman International tem provado que o projeto arquitetônico inovador e contextualmente sensível pode ser um farol de esperança para as comunidades necessitadas. Ao vincular alunos, profissionais e comunidades locais, a instituição mostra que um futuro alentador pode existir.
Para conhecer os exemplos e, talvez, se envolver nos projetos, acesse o site oficial da Journeyman International (JI).